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terça-feira, 27 de março de 2012

PSSSSSSSSSSSSSSIU!

Por Eliane Silvestre


Adoro ouvir o silêncio.
Como bolha de sabão,
Estoura!
Em um momento,
Que vem com argumento:
Pré-nupcial,
Casamento,
Encontro não labial,
Sentimento,
Sepucral,
Mortevida,
Gene “is all”...

O silêncio é como uma morte.
Mortevida dos nossos achismos.
Neologismos.
Que venha o abismo!
Morte de ser um ser banal.

Adoro ouvir o silêncio.
Como gota, cai no mar
Da minha percepção.
Como palavra, emudece.
Como gota, umedece
Todo o meu sim
Que devia ser meu não.

Adoro ouvir o silêncio
E respirar seu escuro.
Perceber tudo que em mim
Está em cima do muro.

Adoro ouvir o silêncio.
Entrar em contato
Com um “sem noção”...
Enxergar minha encenação.
Entrega sem ação.
Dar a minha mão
Para minha alma
E depois voltar desta trip
Com mais calma,
Para saber mais sobre meu “ser”,
O que vou fazer,
Em que quero crer,
Se quero crer no novo
Ou se o velho está bom,
Ou se quero derrubar tudo
Em nova parede colocar meu cimento.
Se quero ter de volta
Meu  casamento
Ou se prefiro continuar a fazer amorpoesia
Com cada um de vocês,
Meus príncipes.
Permanecer brincando de “Era uma vez...”

quarta-feira, 21 de março de 2012

ALGA

por Eliane Silvestre


Alga marinha,
na mão minha.
Alga fora d´água
ficou sequinha.
Cedeu seu verde
para o meu olhar,
que de castanho-mel
verde-mar vai  ficar.
Mar-alga, mar-céu...
Onda que traz água....
Onda que traz alga...
Onda que minha boca salga...
Alga ou algo passará,
se eu não clicar.
Cliquei!
Deixei
nas mãos do tempo ,
que vem a pé
e  entrega ao vento...
Agora, alga não é
de um só momento,
nem de um só olhar...
É imagem a bumeranguear...
Infinitos olhares a apreciar
a onda alga que vai
mas sempre vai voltar.

terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

JOGO DO SONHO

por Eliane Silvestre






Começo a jogada. Eu vou lhe mandar estrelinhas e você vai sonhar que está voando até perto delas. O jogo começa assim, com sonho que não tem limite.

Eu vou lhe dar um sanduiche delicioso e você, que revira o lixo à procura de comida, vai sonhar que terá o que comer todos os dias. Eu vou usar de todos os meios para lhe mandar sorrir e você vai sonhar que aquele sorriso lhe acompanhará pelo resto da vida e você o conseguirá sustentar ainda que sangrando por dentro, porque você ouviu dizer que é bom estar sempre sorridente, que rir faz bem pra saúde etc etc etc. Eu vou lhe colocar num emprego e você, que está desempregado há muito tempo e como homem sente-se frustrado, deprimido, sem imaginar perspectivas, vai sonhar que este emprego lhe possibilitará ter a família que você sempre desejou ter e não teve porque ficou órfão ainda criança. Eu vou lhe dar um livro com páginas em branco para que você escreva sonhando em editá-lo, sem custos e eu vou sonhar que você conseguiu edição /distribuição/venda, mesmo sendo o seu primeiro e ainda que você não seja celebridade de qualquer ramo. Eu vou me candidatar à carreira política e você vai sonhar que eu vou chegar lá e moralizar tudo, vou ser honesta, vou exterminar de vez com qualquer possibilidade de um indivíduo no planeta Terra (nos outros é sonhar demais) não ter a dignidade de uma moradia descente, emprego, infra-estrutura básica para viver enfim como um ser humano e não como bicho; o que tantas vezes vemos e esfregamos os olhos, torcendo que seja sonho. Eu vou anunciar para você que as atitudes de descriminação racial, sexual ou qualquer outra sumiram da face da Terra e você soltará foguetes urgentes, tão urgentes que você deixa o sonho um instantinho de lado, já que a notícia é boa demais e então percebe que o jogo virou e quem sonhou fui eu. Eu vou omitir, esconder, calar tantas verdades que não podem ser ditas na sociedade, vou participar dos conchavos, vou dissimular, vou puxar o tapete do outro porque poderá ter destaque maior do que o meu, vou aceitar que comprem meu silêncio, vou vender minha honra, vou mentir, explorar o outro, e você vai sonhar que um dia eu enxergue que se o motivo profundo de tudo isto for satisfazer o orgulho, o ego ou a ganância de nada serve, é tudo ilusão. Eu vou lhe chamar de amor e você vai acreditar que você é amado e também vai amar, minimizando os defeitos em mim que você enxerga, porque eu também minimizei os que enxergo em você.

O difícil neste jogo é que embaralharam demais as cartas. Já não sei o que é sonho e o que não é. Opto por escolher acreditar que vencerá tudo que significar que possamos ter um mundo melhor, a começar por nós mesmos, revendo nossas atitudes antes de qualquer outra coisa. Se cada um limpa sua partezinha do terreno retirando as ervas daninhas, daqui a pouco o terreno fica todo limpo.

Meus últimos dias tem caminhado muito no campo da sincronicidade (para quem não sabe, trata-se de conceito criado por Jung sobre as coincidências não serem meramente isto e sim algo maior ou seja terem um conteúdo significativo e não casual). Eu vinha pensando sobre a ausência de sonhos em mim, quando Elenilson me pediu para escrever sobre o tema, aproveitando o ensejo da passagem de ano que sempre chama nosso espírito a imaginar que estes próximos 365 dias poderão abrigar a realização de muitos deles.

Eu vinha dizendo que não tinha mais sonhos. Eu estava enganada. O sonho é o combustível da vida. Como acordamos todos os dias e levantamos da cama, se não temos sonhos? São eles que nos fazem dar a mão para o dia e sair realizando as tarefas cotidianas. Nem que sejam sonhos pequenos mas são eles que nos movimentam. Por exemplo, levanto da cama sonhando que naquele dia mandarei consertar o DVD que estou enrolando há tempos e vou concretizar o sonho de assistir aquele filme que queria tanto. Posso dizer sim que não tenho mais grandes sonhos, que me demandariam esforço,ações trabalhosas, riscos, mas não posso dizer que não tenha mais sonhos.

Paro aqui. Percebo que há pouco sonhei que poderia escrever algo sobre sonho, sendo que eu mesma não os encontrava mais dentro de mim e não é que escrevi! Agora me animei e vou encadear aqui um outro sonho: que você que me leu ainda sonhe muuuuuuito, tenha sonhos grandes, que te levem a saborear mais a vida e que lute por eles com fé, coragem, persistência, sem deixar que a visualização do objetivo a ser alcançado te cegue para a consciência de que é um passo de cada vez. Passos que precisam ser dados sempre. Quando o tempo estiver gritando no seu ouvido que você está sendo lerdo, anote os passos que já deu. Isto te ajudará a não se culpar porque ainda não chegou onde queria.

Para o ano novo, sonho que você terá mais de 2012 sonhos realizados. E aí fecho com um sonho maior, de uma psicóloga frustrada que existe em mim. Sonho ouvir um dia de você que me leu até aqui que ainda que do tamanho de um graozinho de areia esta leitura foi válida para a sua vida. Salve 2012! Salve você!

Salve o Literatura Clandestina, cada vez menos clandestino. TIM TIM! http://www.literaturaclandestina.blogspot.com/

segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

CONVERSA COM A BOLHA DE SABÃO

por Eliane Silvestre

Hoje, tomando banho, uma bolha de sabão voou. Eu a segui com os olhos. Observei. Depois cedi minha mão. Ela pousou brilhantemente. Brilhantemente não só por seu brilho, mas porque estacionou com maestria na minha mão. Eu a fitei. Ela também olhou para mim. Parecia querer me dizer alguma coisa. Será alguma coisa relacionada com limpeza? Sou ficha limpa, Dona Bolha! Sou se considerar a carga legal da expressão referente às leis inventadas pelo homem, mas não posso dizer que sou ficha limpa na carga divina da expressão. Se fosse, aqui não estaria. Acredito que se estou aqui tenho muito a aprender para ser um  espírito ficha limpa. Segundo a segundo, pensando em  agir conforme nossa consciência, tentamos não sucumbir à tentação (nada a ver com sexo ou ditas imoralidades, aqui com sentido de ser tentado a sucumbir a todo sentimento negativo), tentamos  ser seres humanos melhores. Eu acredito que todos aqui desejam e buscam ser melhores (cada um sob a sua ótica) ou pelo menos que seus atos sejam condizentes com seus corações. Conforme a ignorância ou sapiência, o barco vai tomando um rumo ou outro no rio da vida. E nos achamos no direito de censurar aqueles que tomam rumos diferentes dos que acreditamos ser o caminho da verdade. Muitos não percebem que melhor do que rotulá-los de imbecis, julgando-se maiores que eles e esquivando-se do contato, o que em determinadas situações justifica-se pelo instinto de sobrevivência, podíamos silenciar a ofensa e pelo menos doar exemplo, conhecimento, ainda que não tenhamos interesse na aproximação, interação.

A bolha estourou. Acordei da viagem. Sorrio quando lembro que Cascão com certeza não teria tido esta oportunidade. Chamo minha criança à responsabilidade. Lembro da entrevista para o emprego. Tenho que sair correndo do banho. Desceu pelo ralo só a sujeira, as fantasias e reflexões deixei aqui.

segunda-feira, 2 de janeiro de 2012


ARDER DA TARDE NA PRAIA


Por Eliane Silvestre



Uma tarde malhada
de sóis e sombras.
Um corpo malhado,
molhado
de céu e ondas.
Um olhar parado,
deitado
na linha do horizonte,
quer andar na linha
e, buscando paz,
acha que o mar é a fonte. 

Um outro olhar infantil
também busca
do mar ouvir conselhos,
esquecer o pai vil,
e, nesta tarde d´ouro que ofusca,
deixa ali seu coração de joelhos. 

Num banquinho, um casal briga,
mas a natureza não liga
                            e continua esbanjando poesia:
                            o coqueiro fotografa a areia
                            e ela faz pose, quando ele grita: Sorria!... 

Todos vieram testemunhar
o encontro do céu com o mar...
Há quem acredite no cair da tarde...
Eu não,
com suas cores de fogo,
acho que não cai, arde
e faz chorar de verdade...


(publicado nos livros "Asas e Vôos", Editora Guemanisse/RJ, de 2006)