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domingo, 25 de dezembro de 2011

BORBOLETINHA

por Eliane Silvestre

Ela tinha
borboletinha no pescoço
e um olhar de cantinho
dirigido ao  bonito moço.

Ele não viu.
A escada subiu.
Ela não desistiu.
Como borboletinha,
seguiu.

 Talvez seja comprometido,
pensou ligeiro ela.
Talvez se ache demais.
Não terá visto
seu olhar pequeno, mas atrevido,
a espiar de forma tão bela
a criação de seus pais? 

O moço parou.
“- Ai que medo ruim! “-
ela suspirou.
“- Percebeu ele, enfim, meu olhar “
- se pôs a sonhar.
“- Lá vem ele!
Caramba, socorro!
Se falar comigo, eu morro.” 

Ficou paralisada.
No rosto, rubor.
E o coração, em fórmula um,
batia a cada passada.
Faminto de amor ,
ansiava  o desjejum. 

Ele chegou de mansinho
e segurou seu pingente.
Falou que achou bonitinho
a borboleta na corrente.

Ela pensou, desconfiada: “- Será?”
Ele seguiu perguntando:
“- To passada!”
Aonde posso encontrar
para comprar
a borboleta que está usando?”
Agora dúvida não há.

Em tic tac ,seu pensamento foi buscar
quanto tempo demorou
aquele trajeto
que sugeriu nascimento de amor
e acabou em aborto.
Amor-morto
ainda em feto.

segunda-feira, 5 de setembro de 2011

SUL-AMERICANA

 por Eliane Silvestre
                                                             

                                                           

 Para viver









                             

precisamos de um norte
ou de um sul.                        
Norteia-me
a visão de tudo.
Descanso, no céu azul.

No horizonte esférico,
perco meu olhar
de um ser américo...

América do Sul.
Amar a América.
Há mar na América!
E que mar!
Mar de raças,
miscigenação.
Em todos os ritmos,
mambo, reggae, tango
bate o sul-coração.

Orgulho de ser latina
Wim Wenders me trouxe
mais e mais ainda.
Olhando a América do Sul,
é  Buena a minha Vista!
Not  only red,white and blue!

quarta-feira, 17 de agosto de 2011

PRATO

Por Eliane Silvestre

Era um prato.
Virou caco.
Que podia cortar.
Não cortou
a inspiração.
Imprudência, distração?
Há um poema no ar...
Inteiro cabia alimento.
Esfacelado, meu encantamento.
Prato azul caiu da mão
para outra utilidade ganhar:
mandala a encantar o olhar...
Azul –sedução.
Na imaginação, me vi  colar
linda arte circular.

(* a foto foi tirada no exato momento que o prato caiu e por incrível que pareça os cacos estavam assim numa outra forma circular)

domingo, 17 de julho de 2011

AXIAMANDO

Por Eliane Silvestre

A cada dia
estou mais  cilíndrica.
Ci –lín – dri - ca
Meu pensamento
está  menos quadrado.
Independente do valor de x ou de y,
na equação da vida, consigo ver
verdade em cada lado.
Estou vendo tudo do centro da esfera.
O universo não é mudo.
Conversa, mostra, vocifera.
Com a paz tracei paralela.
Mas também me quero triangular:
Santíssima Trindade,
Pai, Filho, Espírito-Santo,
pendular.
Sexo sem cálculo de valor,
retas vou angular.
No jogo de varetas
terei uma de cada cor.
Se precisar de muletas,
não hei de usar o amor.
Aonde minhas curvas vão dar?
Em ruas retas claras ou turvas.
Losanguezar-me-ei  circular
até deitar-me
e  enfim  
retangular...


sexta-feira, 1 de julho de 2011

COM NÉCTAR

por Eliane Silvestre

Enquanto não conecta,
Preparo a bebida, com néctar.
Terei mensagem de amor?
Terás comidinha, beija-flor!

A conexão está demorada.
Há alguma coisa errada.
Já o beijinha não esperou.
Conectou o bico e tomou.

E sigo o dia assim,
Espiando o que faz bem pra mim.
Um olho na tela,
Outro na janela.
Espio o mundo pela rede.
Espio do beija a sede.
De frente pro computador,
Sinto-me como um beija-flor,
De site-flor em site-flor,
Pesquisa com brisa.
Estudar entrega néctar ao sonhar.
Sugo nectars diversos,
Que melhoram o meu respirar
E transformo tudo em versos.
Verso-convite a quem me lê
Para alimentar-se do belo que vê.
Se há dor, passará!
Pássaros podem amenizar.
Entregue seu olhos ao vento,
Ainda que em dia corrido, num momento.
Deixe-se ver a valsa deles no ar.

segunda-feira, 27 de junho de 2011

TRÂNSITO LIVRE

por Eliane Silvestre

No engarrafamento,
enquanto   espero o carro voar,
voa  o meu pensamento. 

Meu  corpo está engarrafado,
mas   não aprisiona minh´alma
que  entra na escola ao lado. 
A janela da sala está aberta
e me deixa ver rostinhos conhecidos.
No passado, dou uma incerta:
quebra-queixo, maria-mole,
imagens, cheiros, gostos de tempos idos. 
Tempo em que observava as bolhas de sabão
e que mesmo sabendo que não durariam
 tentava caçá-las para vencer com a mão. 
Meus olhos  de criança
outras bolhas também buscavam.
Ainda trago na lembrança
as bolhas que as gotas da chuva formavam
Elas iam                                   e                                 vinham na poça,
de submarinos eu as chamava:
“- Vou viajar neles quando ficar moça!”
Até que algo me despertava.
Agora também é assim:
um ruído
e é o fim do passado pra mim.
É o sinal da escola que soa
e minha criança sabe bem o que quer dizer:
no coração infantil é a hora boa
da brincadeira ou lanche que vai fazer. 
Senti  todos  estes  gostos na alma,
tudo enquanto o trânsito estava parado.
Para mim mesma bato palma
e vejo que antídoto do stress
é ser sempre um ser alado.

quinta-feira, 23 de junho de 2011

BALANÇO

por Eliane Silvestre

O balanço levanta
o sorriso da criança.
O sorriso voa
e também a trança.
Um gritinho ecoa:
grito de alegria.



No chão, uma flor
a tudo assistia
e parecia
que também sorria.
Dançava com o vento.
Se rápido era o balanço,
parecia samba o seu movimento.
Se o impulso era lento,
cerravam os olhos da menina,
que parecia ganhar o céu.  

Enquanto, na flor pequenina,
um beija-flor, aproveitando a pausa,
sugava seu mel.

quinta-feira, 2 de junho de 2011

O BISCOITO ACABOU

por Eliane Silvestre

Saco vazio de biscoito,
no meio de um trânsito infernal,
alheio a tudo dança em oito,
numa coreografia genial...

Oito é o número do infinito...
Infinitos são os que atravessam
e não acham sequer bonito
que sacos vazios os impeçam,
porque estão cheios da esperteza.
Seus dias tropeçam na hipocrisia.
Seus olhos estão cegos para a poesia
e para ainda achar beleza
num gesto de falta de educação,
de alguém para quem a lata de lixo não existia
quando não sobrou mais biscoito na mão.
Sobrou pra mim olhar assim e perceber o belo...
Do lixo vomitar canção.
Toda imagem do cotidiano faz paralelos
e os opostos lindamente
selam seus elos.

segunda-feira, 9 de maio de 2011

NAS QUATROCENTOS, NUM TRONCO, UMA PEÇA DE MULHER

por Eliane Silvestre


De manhã,
caminhando pelas "quatrocentos" *,
é possível encontrar
quatrocentos motivos
para se sonhar...

Como hoje:
uma árvore vestia um sutiã.

Na madrugada,
ele despiu a namorada,
surpreendendo o sol pela manhã.
Mas o sol também não gostou.
Assim como o anônimo amante,
ele prefere ter sua namorada
pelada.
De sutiã, nem sequer fantasiou.

O sol ficou mesmo contrariado
e vai queimar aquele tecido
até ficar ressecado
e enfraquecido caia,
no chão ao lado,
para depois ser levado
por um lixeiro qualquer
e reciclado,
quem sabe,
novamente pouse
num corpo de mulher.

*algumas das superquadras de Brasília

quinta-feira, 7 de abril de 2011

janela para um poema sem fim

por Eliane Silvestre


...

...

...

por tras de paulistas janelas

por onde entra meu olhar candango

extasiado com a infinidade delas

está um joão ou uma maria

o joão que não para e faz de tudo

a maria mais romântica que anseia poesia

o joão que não fala, é quase mudo

a maria tão matraca que joão anseia ser surdo

o joão que é médico e sai com sono pro plantão

a maria que é doente e vai operar o coração

o joão operário da ópera que é tenor,

a maria bailarina que dançando opera poesia com amor

o joão que come a comida fria da marmita

a maria que para ficar bonita, come e vomita

o joão que trapaça em sua vida de senador e não tem sono

a maria pobre porém honesta que tudo devolve pro dono

o joão que só faz sexo por amor

a maria que quer é fazer não interessa com quem for

o joão que é nordestino

a maria que nega qualquer destino

ele veio do nordeste pra cá no caminhão do sonho

ela nasceu e morrerá aqui porque acha o mundo medonho...

...

...

...

o joão, a janela, a maria

a janela, joão e maria, poesia

a janela, a maria, o joão

minhas janelas da carochinha

rumo a um fim andam na contramão

do meu olhar-janela, eu,poeta, espio sozinha

joões e marias que entram na janela do tempo

e atiçam meus olhos a voarem com o vento

quarta-feira, 6 de abril de 2011

LEVE

por Eliane Silvestre



Tocar.
Estocar alegria.
Tocar, cantar.
Há canto no ar.
Em cada canto,
há mar,
há risos,
há lar.
Asa é minha casa.
Há travessia
sem rumo.
Escoltar a alegria,
meu prumo.
Não mais aceitar
ter mar
no olhar.
Estou leve,
mui leve...
me leve
vou, Ar
:)

sábado, 2 de abril de 2011

NO TREM, DE PASSAGEM

por Eliane Silvestre



Saiam pronomes possessivos!
Com vocês não quero amizade!
Minha busca é afastar-me dos abismos
do apego e da vaidade.
Meu, minha,
meus, minhas:
ilusões passageiras.
Enquanto o trem corre na linha,
não sei em que estação fico eu.
Não importa!
Nem quero pousar meu olhar na porta.
Dela poderá advir o breu,
Aos que entram, “gutiguti”, dou boas-vindas.
Aos que vão e amo,
o pranto engano.
Se vida tenho ainda, se não é finda,
obrigação tenho eu neste trem
de tornar minha viagem linda,
enquanto a parada final não vem.

terça-feira, 4 de janeiro de 2011

CHOVE POESIA

por Eliane Silvestre


Crianças e bicicletas, na chuva.
Conversas infantis, no vento.
Riscando o asfalto, rodas molhadas.
Riscando a tarde, crianças regadas.
Cheirinho de mato encharcado.

Uma melodia procura a chuva,
Fugindo pela janela,
O céu carregado, torna-se refúgio para ela.

Nuvens pesadas
Sonham em ser crianças levadas –
Andam de carona na bicicleta do vento.
E eu penso, neste momento:
Com certeza, não é para criança que se destina
A previsão do tempo.

(publicado nos livros "Asas e Vôos", Editora Guemanisse, de 2006 e "Banco de Talentos da FEBRABAN", de 2003)